Informação policial e Bombeiro Militar

sábado, 21 de junho de 2014

Diário de Pernambuco mostra o outro lado do PACTO PELA VIDA: os baixos salários, o não reconhecimento profissional...

O outro lado do Pacto pela Vida


Não é de hoje que o blog vem recebendo e-mails e ligações com reclamações de servidores das polícias Civil e Militar sobre a falta de reconheciimento por parte do governo do estado para com os servidores. As queixas vão desde a falta de equipamentos de segurança aos baixos salários pagos aos policiais.
Em visita ao Complexo Policial de Prazeres, em Jaboatão, conversei com o delegado Ramon Teixeira, que atualmente responde pela 12ª Delegacia de Homicídios. Numa conversa em sua sala, Ramon traduziu através de uma entrevista o sentimento que afirma ser de todos os servidores da segurança pública estadual.
Antes de assumir o posto atual, o delegado trabalhou com toda a sua equipe na circunscrição de Cavaleiro, também em Jaboatão, durante três anos e meio e conseguiu deixar o bairro de Cavaleiro por mais de 180 dias sem um homicídio. Historicamente, Cavaleiro era conhecido como um dos bairros mais violentos do estado.
Atualmente, em Piedade há um ano, a equipe comandada por Ramon apresenta uma redução de Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLIs) de 43% quando comparado ao mesmo período do ano passado, e um índice de resolução de homicídios de 75%. Confira o desabafo do delegado na entrevista abaixo:
“Temos os melhores índices de resolução de crimes e os piores salários do Brasil”

Delegado Ramon. Foto: Arquivo pessoal
Delegado Ramon Teixeira. Foto: Arquivo pessoal
Qual a sua avaliação sobre o Pacto Pela Vida?
O Pacto Pela Vida pernambucano é, num plano teórico, um programa de segurança pública muito interessante, no sentido de buscar uma atuação integrada entre diversos órgãos direta e indiretamente responsáveis pelo enfrentamento ao crime. Pode-se afirmar, de certa forma, que a execução desse projeto foi bem-sucedida nos sete anos anteriores, mas sua conclusão, lamentavelmente, está sendo algo terrível em 2014.
E o que mudou neste ano no Pacto Pela Vida?
Nada, e é exatamente essa a razão do problema. Os números conquistados pelo Pacto Pela Vida comprovam o sucesso do programa quanto à redução da quantidade de homicídios cometidos no estado, porém é preciso assinalar que, entre suas premissas basilares, se encontravam a formação, a capacitação e, especialmente, a valorização do servidor público. Apesar de muito prometer, contudo, o governo do estado não valorizou devidamente o seu policial, que é o servidor público diretamente responsável por tal sucesso; ironicamente, o resultado dessa negligência também pode ser expresso em números.
Então, o senhor acredita que o PPV pode ter resultado negativo neste ano?
Certamente. O Pacto Pela Vida caminha, pela primeira vez em oito anos, para um aumento no número de homicídios, grosso modo, por não valorizar seu policial. Trata-se, evidentemente, de um processo de desgaste paulatino e contínuo, não ocorre da noite para o dia; foram anos de espera por um merecido reconhecimento que, apesar das promessas governistas, nunca veio. Por isso, naturalmente, o inconformismo dos policiais civis e militares culminou em manifestações públicas de insatisfação e chegou, no caso desta última, à deflagração de greve.
Recentemente, foi publicada no blog uma pesquisa feita pelo delegado Igor Leite, na qual 94% dos delegados afirmaram estar insatisfeitos. O motivo da insatisfação é exclusivamente salarial?
Não, o problema não é simplesmente remuneratório, com a mais absoluta certeza. É, sobretudo, a falta de valorização profissional que indigna a quase todos os delegados daqui – a remuneração consiste somente no lado financeiro da questão. Quer ver? A mesma pesquisa por você citada aponta que 91% dos delegados pernambucanos trocariam, se pudessem, seu cargo por outra carreira jurídica com salário equivalente ou superior. Noutras palavras, nove em cada dez delegados de polícia pernambucanos preferiam ser, por exemplo, delegados de polícia em qualquer outro estado da federação que lhes pagasse pelo menos a mesma coisa! Isso é um retrato do cenário desolador em que se encontram esses dedicados profissionais em Pernambuco.
Em que consiste, na prática, essa desvalorização profissional?
Consiste no injustificável descompasso entre o volume de trabalho existente, o nível de cobrança exercido sobre a produtividade, a qualidade dos resultados alcançados pelos ocupantes do cargo e a sua realidade remuneratória. Ora, se você trabalha por absurdas 64 horas semanais ou mais, é diariamente demandado por cada homicídio ocorrido em sua área de atuação territorial, apresenta os melhores índices de resolução de crimes entre todas as Polícias Civis do país e recebe o segundo pior salário da categoria no Brasil – caso dos delegados de polícia pernambucanos –, como não se indignar? Como não se sentir injustiçado, frustrado, desvalorizado?
Os delegados de Pernambuco recebem o 2º pior salário do país?
Sim, alguns reais a mais do que o último lugar do ranking nacional, o Espírito Santo. Delegados de polícia pernambucanos têm uma remuneração bruta inicial, acredite, cerca de duas vezes e meia menor do que a dos delegados goianos em início de carreira. Então é isso, por si só, que indigna a todos aqui? Com certeza, não. É, sim, o fato de que Goiás, a título de exemplo, contabiliza 44,3 homicídios por 100 mil habitantes, ao passo que Pernambuco, segundo dados do Mapa da Violência de 2014, atingiu a marca de 37,1 homicídios por 100 mil habitantes. Indigna o fato de que Pernambuco foi o único estado nordestino a apresentar diminuição no número de homicídios na última década, embora os delegados de polícia pernambucanos sigam com o pior salário da região Nordeste.
O senhor falou em uma carga horária de 64 horas por semana ou mais, é essa a jornada de trabalho de um delegado de polícia em Pernambuco?
Para muitos, é, sim. Há alguns anos, o governo do estado de Pernambuco criou uma espécie de sistema de complementação salarial, o chamado Programa de Jornada Extra de Segurança, PJES, que consiste na remuneração por blocos de horas trabalhadas em regime de plantão, além do horário normal do expediente. No âmbito da Polícia Civil, essa jornada de trabalho extraordinário vem sendo há anos remunerada pelo estado de Pernambuco, no entender da ADEPPE, em descumprimento da legislação vigente, pagando por meio de decreto valores que chegam a ser quase sete vezes menores do que o efetivamente devido na forma da lei, o que seria, por óbvio, ilegal conforme esse entendimento.
Essa é uma queixa só dos delegados ou de todos os policiais civis?
Os ocupantes de todos os cargos policiais civis, sem sombra de dúvida, têm as mesmas reclamações a fazer. Insiste-se na ideia de que o cerne da indignação dos policiais civis está na falta de valorização profissional; portanto, quem integra os quadros da instituição que, em alguns aspectos, funciona como o motor do Pacto Pela Vida, mas é tratado pelo governo como coadjuvante e descartável, fica justamente inconformado.
Recentemente, o governador João Lyra Neto afirmou não ser possível negociar aumento salarial para os delegados da Polícia Civil, assim como para os PMs que entraram em greve alegando que não podia mais negociar em ano eleitoral. Como o senhor vê essa posição do governo do estado?
Sob o argumento da legislação eleitoral, vejo como inverídica. É possível, sim, negociar a reestruturação da carreira nos termos propostos por representantes da ADEPPE, mas, em vez de adentrar o viés jurídico da questão, prefiro trazer à tona que, logo depois das declarações do chefe de nosso poder executivo estadual, o governo potiguar encaminhou e a Assembleia Legislativa aprovou significativo reajuste salarial para policiais e bombeiros militares; além disso, foi igualmente noticiado, na mesma época, que o governo federal acordou um reajuste salarial para agentes, escrivães e papiloscopistas da Polícia Federal. Ora, seria apenas em Pernambuco que a legislação nacional supostamente vigeria, ou se trataria esse, verdadeiramente, de um argumento não compatível com a realidade?
O senhor, como delegado de polícia, está naquele grupo de insatisfeitos com o cargo e trocaria de carreira jurídica se pudesse?Tristemente, no atual cenário, sim. Veja, o mínimo que se espera de um ente federativo é que valorize seus servidores públicos, para que sempre produzam com mais qualidade e eficiência. Se você, estado, não os valoriza e não lhes reconhece o trabalho duro, você irá perdê-los. Considero-me, sem falsa modéstia, muito bom no que faço – não por talento ou outra qualidade individual inata, mas por trabalhar muito e dedicadamente. Recusei-me, já delegado de polícia em Pernambuco, a tomar posse em dois concursos públicos financeira e geograficamente mais vantajosos para mim, simplesmente porque, vocacionado para o cargo, acreditei nas promessas governistas de valorização profissional da carreira. Vários outros delegados de polícia, aqui talvez falando de dezenas de profissionais, passaram por situação semelhante; hoje, acredito que nenhum deles tomaria igual decisão. Há delegado de polícia em Pernambuco, acredite se quiser, disposto a se licenciar sem remuneração apenas para estudar para sair, tamanha sua indignação com a presente conjuntura.
O senhor acredita que a insatisfação pode afetar a qualidade do trabalho policial?
Acredito que todos com quem trabalho muito bem sabem que não somos servidores públicos do governo, nem trabalhamos para um programa de segurança pública. Somos servidores públicos do estado, trabalhamos para a sociedade e dela fazemos parte, para a qual desejamos, pessoal e profissionalmente, proporcionar a melhor qualidade de vida possível. Se conseguirmos gerar, por meio de nosso trabalho, um pouco mais de segurança ao cidadão, então o trabalho estará sendo realizado a contento, independentemente de nosso estado de espírito.

Fonte: Blog da Segurança Pública do Diário de Pernambuco

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