Informação policial e Bombeiro Militar

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Apesar de proibição, oficiais da PM prestaram serviços para Liesa no Sambódromo



Empresa que fez segurança no Sambódromo é de coronel da reserva

SÉRGIO RAMALHO

Material apreendido. Policiais deixam a sede da Liesa, no Centro, com documentos recolhidos na entidade: na operação, foram encontrados indícios de ligação com o bicho
Foto: Gabriel de Paiva/31-1-2013 / O GloboMaterial apreendido. Policiais deixam a sede da Liesa, no Centro, com documentos recolhidos na entidade: na operação, foram encontrados indícios de ligação com o bicho Gabriel de Paiva/31-1-2013 / O Globo
RIO As escolas de samba do Grupo Especial estarão sob os holofotes no domingo no Sambódromo, no primeiro dia de desfiles do Grupo Especial. Mas, há nove dias, uma operação da Corregedoria da Polícia Civil jogou luz foi sobre irregularidades na Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa), que representa as agremiações. Na sala do presidente da entidade, Jorge Castanheira, agentes cumpriram mandados de busca e apreensão, recolhendo evidências de que oficiais da Polícia Militar, entre eles coronéis e majores, ignoraram uma determinação da Secretaria de Segurança e atuaram na segurança interna do Sambódromo no ano passado
Entre os documentos apreendidos durante a Operação Dedo de Deus 2, figura uma planilha com 37 nomes de pessoas que trabalharam no controle do acesso à Passarela do Samba no desfile de 2012. Na época, já estava em vigor uma portaria assinada pelo secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, proibindo policiais militares ou civis de fazerem esse tipo de serviço. Apesar da determinação, os nomes de seis coronéis (alguns deles da reserva da PM), cinco majores e um capitão aparecem no documento como coordenadores e supervisores de segurança da MJC Eventos. A empresa presta serviços à Liesa e tem entre seus sócios o coronel da reserva da PM Celso Pereira de Oliveira.
O GLOBO teve acesso com exclusividade a parte do material recolhido na sala de Castanheira. No local, foram apreendidos dois laptops, uma CPU, um pen drive e alguns documentos.
Mas a descoberta de que PMs atuaram na segurança interna do Sambódromo não foi o único problema encontrado durante a operação. Em meio à papelada, uma carta endereçada ao presidente da liga sugere que Castanheira não lida apenas com questões relacionadas às escolas de samba. Em duas páginas escritas à mão, o autor, que se assina João Luiz, diz ter uma pendenga com o bicheiro José Caruzzo Escafura, o Piruinha, e pede ao presidente que interceda a seu favor junto ao contraventor Antônio Petrus Kalil, o Turcão.
O autor da carta, datada de 29 de setembro de 2011, inicia o texto pedindo desculpas por importunar o presidente da entidade. E sugere num trecho que Castanheira tem pleno conhecimento das regras impostas pelos contraventores que integram a máfia do jogo ilegal no Rio: O senhor e os demais contraventores, exceto o senhor José Escafura, que há anos não respeita e nem faz valer a regra da máfia a qual encontra-se (sic)...
Contas teriam sido pagas por bicheiro
Não foi o único indício de ligação com a contravenção encontrado. Na mesma operação, agentes da Corregedoria da Polícia Civil, que foram, além da Liesa, a outros 13 endereços, descobriram numa central de apuração do jogo do bicho do contraventor Ailton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães, no Centro, sete contas de consumo de energia elétrica em nome de Castanheira. A descoberta sugere que o presidente da Liesa pode ter tido faturas suas pagas por Guimarães.
Procurado pelo GLOBO, Jorge Castanheira negou qualquer envolvimento com o jogo do bicho e afirmou desconhecer a existência da carta apreendida pela polícia. Também negou que suas contas de luz tenham sido pagas pelo Capitão Guimarães:
Esse processo está em segredo de Justiça. Eu não tive acesso ao processo, mas a imprensa teve. Não consigo entender. Não tenho ligação com o bicho. Hoje sou presidente da Liesa, mas comecei a trabalhar aqui há 28 anos, como auxiliar de serviços gerais. Nesse período, me formei em economia. Recebo centenas de cartas como presidente da Liesa, mas nenhuma para tratar de questões relacionadas ao jogo do bicho. Não tenho nada com a contravenção e também não sei que contas de luz são essas.
Castanheira acrescentou que teve em seu nome apenas contas de luz de uma sala no Centro onde a Liesa funcionou de 1987 a 1995. Com relação à contratação de PMs para atuarem no controle do acesso ao Sambódromo, ele afirma ter solicitado à MJC que desse prioridade aos oficiais da reserva.
Regra também vale para PMs inativos
Apesar da observação de Castanheira, oficiais da reserva da PM não estão isentos de obedecer a determinações da Secretaria de Segurança. É o que estabelece o decreto 6579/83, que instituiu o regulamento disciplinar da PM. Segundo a norma, a disciplina e o respeito à hierarquia devem ser mantidos permanentemente pelos policiais militares tanto na ativa como na inatividade. Com isso, a portaria de Beltrame se aplica também aos PMs inativos.
A Secretaria de Segurança informou que fiscaliza a prestação irregular de serviços por parte de seus funcionários durante o carnaval. De acordo com a nota, desde 2008, com a atuação da Corregedoria Geral Unificada, da Corregedoria da Polícia Militar e da Corregedoria da Polícia Civil, mais de 1.393 policiais civis e militares foram expulsos, por diferentes desvios de conduta.
A Operação Dedo de Deus 2 foi desenvolvida a partir do cruzamento de informações obtidas durante a Dedo de Deus 1, deflagrada em dezembro de 2011. Na segunda etapa da operação, realizada em 31 de janeiro passado, a polícia chegou a pedir a prisão dos contraventores Capitão Guimarães e Luiz Pacheco Drumond, o Luizinho Drumond, ex-presidentes da Liesa. A Justiça, no entanto, não concedeu as prisões.
O monopólio intocável da Liesa
Por quê? É a pergunta que não quer calar quando se especula os motivos que fazem a Liga Independente das Escolas de Samba do Grupo Especial (Liesa) dominar há cerca de 18 anos o carnaval carioca, de cabo a rabo, da iluminação à arrecadação com a venda de ingressos, passando pelo som e tudo o mais que diz respeito à festa. Tendo em sua origem pessoas ligadas ao jogo do bicho, a entidade tem o monopólio do carnaval desde 1995. Sai ano, entra ano, e as promessas de uma concorrência pública não vão para a frente. O prefeito Eduardo Paes chegou a anunciá-la várias vezes e até a lançar uma licitação para o ano de 2010, mas a proposta naufragou numa série de exigências do Tribunal de Contas do Município. Ao contrário do que prega a contravenção, não valia o que estava escrito, a concorrência tinha que ser revista e não havia tempo para isso. Moral: também não valeu o que foi dito por Paes, e o carnaval de 2011 caiu, de novo, no colo da Liesa. No ano passado, por falta de concorrência em 2009, a Justiça chegou a bloquear os bens do ex-prefeito Cesar Maia, que contratou a Liga por R$ 5,3 milhões.

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