Apesar de duas decisões contrárias à greve de policais civis, agentes e escrivães mantêm uma rotina de ocupação na Assembleia Legislativa de Goiás (Alego), em Goiânia. Com as atividades paralisadas há 66 dias, servidores do interior do estado e da capital montaram, no início da semana, um acampamento no plenário da Casa. Enquanto alguns fazem escalas de revezamento, outros permanecem praticamente o tempo todo no local.
Entre os manifestantes em tempo integral está o agente Anderson André da Silveira, de 41 anos, que trabalha há 16 anos em Catalão, no sudeste do estado. Ele está na Alego desde segunda-feira (18), quando a ocupação começou, e conta que só sai para tomar banho "na casa dos  amigos". O policial dorme em uma barraca montada em uma das laterais do plenário e faz todas as refeições dentro do salão. "O sindicato fornece marmitex. Mas é dinheiro nosso, porque a gente contribui, paga mensalidade", disse em entrevista ao G1 .

Investigador do Grupo Especial de Repressão a Narcóticos (Genarc), ele preferiu não mostrar o rosto, para não ser reconhecido em futuras ações de combate ao tráfico de drogas. Mesmo cansado, ele afirma que só deixará o plenário após um acordo. "Diferente do que está sendo passado, não tem um diálogo. O governo só manda recado e o próprio secretário de Segurança Pública só se reuniu com a liderança após a intervenção do Ministério Público", critica.
Policiais civis em greve se revezam para manter ocupação na Assembleia Legislativa, em Goiás
Diferente de Anderson, a agente Gelsiane Silva, da delegacia de Campinorte, não estava preparada para um possível acampamento quando saiu do norte de Goiás, na segunda-feira. "Vim para a assembleia. Quando chegamos aqui e nos informaram que não havia proposta para a  categoria o pessoal se revoltou e resolveu ocupar. Eu decidi ficar e apoiar porque só com a união vamos conquistar nosso objetivo", explicou.

Gelsiane passa o dia com colegas de profissão e, à noite, dorme na casa de parentes. "Eu visto a camisa da Polícia Cilvil, amo minha profissão. Vou ficar até recebermos uma proposta satisfatória", afirmou.
A quantidade de pessoas dentro do plenário varia de 500, nas horas mais movimentadas do dia, a 100, que dormem no local, de acordo com o Sindicato dos Policiais Civil de Goiás (Sinpol).
Entre os policiais de Goiânia que se revezam no local está a escrivã Fernanda Barbosa Mendes, 32 anos. Ela diz que comparece no plenário nos períodos da manhã e da tarde e reclamou: "É a primeira vez que estamos enfrentando um corte de pontos. Essa retaliação desnecessária deu uma acalorada no movimento".
Carolina Borges de Matos, agente da DPCA durante ocupação na Assembleia de Goiás - Goiânia
Na manhã de quinta-feira (21), os policiais estavam descontraídos e tinham a expectativa de receber uma contraposta do governo. Um grupo conversou com a reportagem, falou da possibilidade de acordo e até apontou a escrivã da Delegacia de Proteção à Criança e ao  Adolescente de Goiânia (DPCA) Carolina Borges de Matos, de 30 anos, como uma das mais belas do movimento.

Ao G1 , a "musa da ocupação" contou que está na escala de voluntários do período diurno. Vai para a assembleia todos os dias às 8h e fica até as 22h e se mostrou  animada com a mobilização: "Não sou radical. Estamos flexíveis a uma proposta, desde que nos valorize".
Agressão 
O clima oscila entre o otimismo e a indignação. Em um dos momentos mais tensos, na tarde de terça-feira (19), o jornalista Rubens Salomão, repórter de uma rádio da capital, foi hostilizado e retirado do plenário à força pelos grevistas. "Fui agredido. Vários grevistas me cercaram, me arremessaram uma garrafa e um deles me deu um tapa na cabeça por trás. Enquanto me enxotavam do plenário, gritavam a palavra lixo", relatou.
Para o repórter, os policiais mostraram intolerância com opiniões contrárias ao movimento. "Não faço matérias sobre a greve. Eu cubro política e fui lá falar com deputados. Me incluíram na posição da emissora, sendo que eu sou um funcionário que tem independência. E posição da rádio não é necessariamente a minha. Foi uma agressão à liberdade de imprensa", criticou.
Liminar 
A situação voltou a ficar tensa no início da tarde de quinta-feira, após a reunião entre o presidente da União Goiana dos Policiais Civis (Ugopoci) e secretário de Segurança Pública, Joaquim Mesquita, terminar em impasse. Também foi divulgada a decisão do Tribunal de Justiça de Goiás  (TJ-GO) determinando o retorno imediato dos policiais civis ao trabalho. Em caso de descumprimento da decisão, o desembargador Leobino Valente Chaves estipulou pena de multa diária de R$ 10 mil.

"Viemos aqui negociar a contraproposta, mas ouvimos que a Justiça determinou o nosso retorno ao trabalho e que o governo só tem a nos oferecer o bônus de produtividade, o que não nos contempla. O bônus é uma das nossas reivindicações, mas ele não significa uma melhora no piso", afirmou o sindicalista. Apesar da determinação, o presidente da União Goiana dos Policiais Civis (Ugopoci), Ademar Luiz de Oliveira, disse que a greve, assim como a ocupação, serão mantidas.
Polciais civis em greve ocupam Assembleia Legislativa de Goiás, em Goiânia
A decisão do desembargador foi a segunda derrota jurídica do movimento grevista. Na tarde de quarta-feira (20), a juíza substituta da 1ª Vara da Fazenda Pública Estadual de Goiânia, Aline Vieira Tomás, determinou a reintegração de posse do plenário da Assembleia Legislativa. A magistrada estabeleceu um prazo de quatro horas para o cumprimento da decisão, após a notificação, sob pena de emprego de força policial militar.
Por três vezes um oficial de Justiça esteve na Assembleia para notificar os grevistas, mas o representantes legais do movimento não foram encontrados no local, para assinar a notificação.
A greve dos escrivães e agentes da Polícia Civil começou no último dia 17 de setembro. O diretor jurídico do Sinpol, Rainel Mascarenhas, explicou ao G1 que no fim da última greve ficou acordado entre o sindicato e o governo o aumento do piso salarial, parcelado em dois anos, além do bônus por produtividade. Como esse acordo não foi cumprido, a categoria iniciou o movimento de paralisação.
No início de novembro, o governador Marconi Perillo (PSDB) determinou o corte de ponto dos grevistas. Segundo ele, todas as alternativas de acordo já haviam sido apresentadas.  “Aquilo que é possível já foi sinalizado, o que não é possível não será feito”, justificou Perillo.