Informação policial e Bombeiro Militar

sábado, 31 de agosto de 2013

Após mortes de PMs, oficiais das polícias Civil e Militar contam como guardam e apresentam revólver às crianças



O caso Pesseghini, que envolveu a morte de uma família de PMs em São Paulo , comoveu o opinião pública e levou uma nova discussão para dentro da casa de policiais. Isso porque o menino Marcelo, de apenas 13 anos, teria usado a arma da mãe para matar os pais, a tia e a avó antes de cometer suicídio, conforme versão da polícia. As suspeitas contra ele despertaram preocupação entre os profissionais que têm filhos e armas de fogo dividindo o mesmo espaço. O iG conversou com policiais civis e militares que revelaram como mantêm um instrumento de trabalho letal no convívio familiar.
O policial militar J*, de 39, está há 20 anos na corporação e nunca temeu a presença de armas de fogo em casa até o dia 5 de agosto. Foi quando ouviu de sua mulher: “Querido, estamos seguros?”. Foi a primeira discussão do casal sobre o assunto após duas décadas. “Comecei a pensar se estava dando brecha para uma tragédia. E estava”. Cansado, o policial contou que chegava em casa ainda fardado e deixava a arma em cima de uma mesa antes de guardá-la. Após a conversa, mudou seus hábitos e passou a ir direto para o quarto se trocar e pensar em um esconderijo para a arma.
Pai de dois meninos adolescentes, de 14 e 17 anos, J. explicou que é importante reconhecer a curiosidade dos filhos. “Eles sempre tiveram a visão do pai super-herói e que arma só é usada contra pessoas ruins. É crucial explicar que ela só serve para ferir e matar alguém”. Entre os 10 e 12 anos, segundo o PM, seus filhos pediram para manusear a pistola de calibre .40, padrão da Polícia Militar. “Mostrei a eles como funcionava na minha mão e sem munição.”
Uma prática comum citada por todos os policiais entrevistados é mudar periodicamente o local do esconderijo. Na casa da delegada Marilda Pansonato Pinheiro, policial há 15 anos e presidente da Associação de Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Adpesp), foi fácil reconhecer qual, entre seus três filhos, era o curioso. “Apenas um tinha curiosidade de ver a arma. Ofereci a mesma explicação aos outros dois e foi rejeitada. No final, o curioso virou segurança e os outros foram para o direito e medicina”.
Filha de policial e com duas armas em casa - um revólver 38 e uma pistola Glock 380 -, Marilda disse que é crucial “abrir o jogo” com os filhos e evitar que a curiosidade infantil fale mais alto. “Se você virar as costas, a criança pode procurar aprender sozinha”. Ela explicou que após a formação policial a arma passou a ser a extensão do seu corpo. “Se você abre a minha bolsa, entre os meus batons, está o 38”. Para a policial, não existe um manual e cada um conhece os lugares mais seguros da própria casa. Embora Marilda não tenha uma opinião formada sobre o caso que abalou a zona norte, garante que a classe não está indiferente.
“Subestimamos as crianças”
Lucy Mastellini Fernandes é delegada-titular do 3º DP, de São Caetano do Sul, e tem arma em casa há 16 anos. Mãe de duas meninas, Lucy acredita que teve sorte, pois as filhas nunca manifestaram qualquer interesse em conhecer os armamentos que ficam escondidos na casa. Mas isso não ocorre em todos os lares. Ela investigou o caso do menor de 10 anos que, em 2011, atirou contra a professora e se matou no corredor da escola, em São Caetano do Sul. A criança usou a arma do pai, um Guarda Civil Metropolitano (GMC), que não chegou a ser indiciado.
Para a delegada, o pai pegou a maior pena por perder o filho pela própria arma. “Senti demais porque poderia ser uma das minhas filhas”. Lucy acredita que casos que envolvem crianças, como o da família Pesseghini, ganham resistência da sociedade, mas são possíveis. “Subestimamos as crianças e precisamos entender que eles não têm uma visão profissional da arma”.
Dilema da profissão
O assunto provoca divergências, no entanto, quando se trata de deixar a arma suficientemente acessível para se proteger e, ao mesmo tempo, longe o bastante para evitar uma tragédia. O PM J. admite que, apesar dos cuidados, nunca desmonta a arma e costuma deixá-la carregada caso necessite em uma situação de emergência. “Preciso deixar em local próximo. Já que todos esses cuidados (até municiar e montar) diminuem o meu tempo de golpe (de resposta).”
Já o policial rodoviário aposentado C.P., de 50 anos, pensa diferente. Ele conta que, quando seu filho era mais novo, optava por desmontar a pistola .40 que usava em serviço para garantir que a arma não provocaria nenhum acidente em casa. “(Guardava) sempre descarregada ou desmontada. Eu me preocupava em colocar em lugares diferentes. Nunca no mesmo lugar. Mudava (o local) com o tempo.”
Os distintos pontos de vista podem ser, inclusive, fruto da falta de orientação da Polícia Militar. O policial J, por exemplo, reclama que nunca teve instrução. “Durante toda a minha formação não tive nenhuma orientação de como proceder com a arma em casa. A única fala é ‘toma cuidado com sua arma porque ela é da corporação de responsabilidade unicamente sua’”, revelou.
O iG procurou a assessoria de imprensa da Polícia Militar para saber se existe orientação oficial da corporação a respeito do tema, mas não obteve nenhuma resposta em quatro dias de espera. O Instituto Sou da Paz, por sua vez, explicou que este é o dilema da profissão. “Se você deixa arma pronta para uso, ela está acessível também para as crianças”, opinou o coordenador de Sistemas de Justiça e Segurança Pública do instituto, Bruno Langeani.
Como funciona no Brasil?
As recomendações sobre como conciliar armas e filhos em casa servem também para cidadãos que têm direito à posse de armas, já que o seu porte continua proibido à população em geral. Salvo casos de “comprovada ameaça”, uma pessoa comum só pode ter uma arma para manter dentro de residência ou estabelecimento pré-determinado em documento antes da compra. É contra a lei, portanto, andar armado ou transportar revólver sem autorização.
Para o direito à posse uma pessoa tem de ter pelo menos 25 anos, nenhum antecedente criminal, e ainda passar por exames psicológicos e técnicos. Mas a recomendação mais importante, segundo o instituto, é não ter armas. “Ter arma em casa reduz muito os riscos para a pessoa e para a família. Todo mundo está sujeito a ter briga dentro de casa. Você ter arma a mão aumenta muitos as chances (de tragédia). Uma pessoa que tem arma em casa tem muito mais riscos de se envolver em suicídio, homicídio ou disparo acidental.”
iG 

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