Juiz poderá soltar preso em flagrante como experiência na cidade de São Paulo
Camila Boehm – Repórter da Agência Brasil
Edição Jorge Wamburg
A audiência de custódia ajudará a diminuir a superlotação carcerária, fazendo com que o juiz decida sobre a real necessidade de manter uma pessoa dentro da prisão, e ainda permite que ele avalie a ocorrência de tortura ou de maus-tratos. É o que pensa o presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Augusto de Arruda Botelho.
“O grande ponto da audiência de custódia é fazer com que as prisões confirmadas sejam de fato necessárias, para que possamos melhorar o número absurdamente excessivo de prisões provisórias que temos no país, que acaba fazendo com que o Brasil tenha a terceira maior população carcerária do mundo”, opina Botelho.
Ele considera a medida importante, diante da realidade dos processos dos réus presos atualmente, que é assustadora do ponto de vista do respeito aos direitos e garantias fundamentais: “Uma pessoa presa em flagrante hoje, aqui em São Paulo, em um cenário otimista, vai ver um juiz pela primeira vez em três ou quatro meses, [a partir] da data da prisão dela”.
Durante a entrevista com o juiz, o preso será ouvido e as manifestações do Ministério Público, da Defensoria Pública ou do advogado de defesa serão colhidas. Esse é um projeto-piloto, desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), TJ-SP e Ministério da Justiça, em cumprimento a uma determinação prevista no Pacto de San José, que prevê a rápida apresentação do preso em flagrante a um juiz.
São esperados entre 25 e 35 presos por dia neste início do projeto, de acordo com o juiz Antonio Maria Patiño Zorz, do Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária (DIPO), órgão que conduzirá as entrevistas no Fórum Criminal da Barra Funda.
Um aspecto de destaque no projeto é a possibilidade de serem identificados indícios de violência e ilegalidade durante a prisão. Para Botelho, “a tortura e os maus-tratos são, infelizmente, uma realidade presente no Brasil todo. Às vezes, a apuração desse crime torna-se difícil porque o preso se encontra com o juiz muito tempo depois e, eventualmente, as marcas desses maus-tratos ou dessa tortura já não estão mais presentes”.
Apesar de a pessoa passar pelo exame de corpo de delito quando é presa, as marcas desse tipo de violência, às vezes, passam despercebidas pelo exame, segundo o presidente do IDDD. Por isso, é recomendado ficar frente a frente com o juiz o quanto antes.
Uma estrutura com centrais de alternativas penais, de monitoramento eletrônico, de assistência social e câmaras de mediação penal fazem parte do projeto e poderão apresentar ao juiz opções à prisão provisória. “Não teremos só as audiências, teremos ainda estes organismos periféricos, que são essenciais para que esse projeto dê certo”, afirmou o juiz Zorz.
“Esse é um projeto do ministro Ricardo Levandowski, que quando assumiu a presidência do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, recebeu um documento da Organização das Nações Unidas, dizendo que grande parte da responsabilidade da superlotação do nosso sistema carcerário devia-se não só ao executivo, mas também ao judiciário”, afirmou o juiz Luís Geral Sant'Ana Lanfredi, coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do CNJ.
O relatório levou a responsabilidade ao judiciário, que chegou à conclusão de que, no Brasil, a prisão, que deveria ser exceção, virou regra. “Todos nós já sabemos da quantidade de presos que temos recolhidos e das precárias condições em que eles se encontram”, reconheceu Lanfredi.
O objetivo do CNJ é implantar e testar o projeto-piloto na capital paulista e depois levá-lo para o restante do país. O IDDD fará um monitoramento e apresentará sugestões para o aperfeiçoamento do projeto. “Nosso interesse é que a audiência de custódia não aconteça só aqui, mas que se torne algo a ser aplicado em todos os estados”, acrescentou Botelho.
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