Cidadania
Andreia Verdélio - Agência Brasil
As relações raciais no Brasil não admitem declarações sobre preferências ou atitudes racistas. Entretanto, dados oficiais comprovam a existência de filtragem racial nas instituições policiais do país, chancelada pelo próprio sistema de Justiça, conforme afirmou hoje (6) o professor Danilo Morais, pesquisador do Núcleo de Estudos Afrobrasileiros da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). Em 2012, ele participou da pesquisa “Filtragem racial na seleção policial de suspeitos: segurança pública e relações raciais”, que identificou os mecanismos de atuação das Polícias Militares de São Paulo, Minas Gerais, do Rio de Janeiro e Distrito Federal.
Conforme a pesquisa, a proporção de jovens negros mortos em ação policial é três ou quatro vezes superior à de brancos. No Rio de Janeiro, para cada 100 mil habitantes, 3,6 negros são mortos pela polícia, contra 0,9 brancos. Em São Paulo, também para cada 100 mil habitantes, os índices são de 1,4 negros para 0,5 brancos. “Em São Paulo, o negro tem mais chance de ser morto pela polícia, ainda que eles não admitam o fato”, disse Morais.
Ainda em São Paulo, para os mesmos 100 mil habitantes, as taxas de encarceramento de presos em flagrante são 35 negros e 14 brancos. Entre 2008 a 2012, 54% das prisões em flagrantes no estado foram de negros, ante 42,9% de brancos.
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“Se partíssemos da premissa racista, os negros são presos porque cometem mais crimes. Na verdade, pela premissa não-racista, observa-se que condutas ilícitas da população negra são mais vigiadas. Por isso, as prisões em flagrante. Elas não são fruto de investigação policial”, explicou o pesquisador da Ufscar.
Durante as entrevistas, os policiais relataram aos pesquisadores que o tirocínio - capacidade de reconhecer os criminosos por marcas objetivas - é construído ao longo do “tempo de rua”. Entre as marcas descritas, destacam-se as tatuagens, os carros rebaixados e o uso de moletons em dia de calor. Segundo Morais, os policiais até admitem alguma discriminação de natureza econômica com as pessoas mais pobre, mas nunca racial.
“Não é racismo individual. Temos um modelo de policiamento e instituições policias moldadas para resultados. Estamos falando também do sistema de Justiça. Se os negros são mais presos e continuam presos, significa que o Judiciário, de alguma forma, chancela essa forma de segurança pública”, salientou.
Morais elogiou o Plano Juventude Viva, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República. Segundo ele, é a única política pública que considera os elementos étnico-raciais e etários na prevenção da violência, mas incide pouco, do ponto de vista da segurança pública, na redução da letalidade policial.
“Embora o policiamento tenha a ver com as secretarias estaduais de segurança pública, o governo federal, por meio do Ministério da Justiça, poderia implementar ações para que fossem considerados os elementos de cor, raça e idade na formação policial. Deveria estabelecer, ainda, procedimentos operacionais padrão e formular coleta de dados. Está pacificada a tese de que esses elementos são importantes no acompanhamento das desigualdades raciais nas áreas de saúde, educação e trabalho. Então, também deveria ser para a segurança pública”, assinalou o pesquisador.
Morais participou hoje, no Ministério da Justiça, em Brasília, do ciclo de atividades sobreJuventude Negra Brasileira: Homicídios e Encarceramento. Aberto ao público, o evento será encerrado amanhã (7).
Editor Armando Cardoso
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