sexta-feira, 18 de abril de 2014

Após 52 assassinatos em dois dias, PM da Bahia encerra greve


Policiais militares e governo fazem acordo, mas tropas federais ficarão no Estado até a situação se normalizar
Lojas voltaram a ser saqueadas na capital baiana; paralisação policial é a segunda em pouco mais de 2 anos
JOÃO PEDRO PITOMBODE SALVADORANDRÉ UZÊDAENVIADO ESPECIAL A SALVADOR
Policiais militares da Bahia encerraram ontem a greve da categoria, após quase dois dias de paralisação.
A greve foi acompanhada por uma explosão da violência na Grande Salvador, a região mais afetada.
Houve saques e ao menos 52 pessoas foram assassinadas em 46 horas, mais de uma por hora. A média diária na região metropolitana de Salvador é de cinco casos.
A população sofreu com transtornos: ônibus deixaram de circular, lojas fecharam e eventos foram cancelados.
O movimento também expôs mais uma vez a relação delicada entre a PM baiana e a gestão Jaques Wagner (PT). Foi a segunda greve da PM em pouco mais de dois anos.
Como na paralisação anterior, o líder foi o soldado Marco Prisco, agora vereador em Salvador pelo PSDB, eleito na esteira da visibilidade alcançada em 2012 e pré-candidato à Assembleia Legislativa.
Wagner, que apontou interesses "eleitorais" no movimento, negou que tenha cedido a pressões. "O que foi assinado hoje [ontem] é praticamente igual ao ofertado antes da greve", disse.
A PM reivindicava aumentos das gratificações, garantias de progressão de carreira e sanções mais brandas no novo código de ética da corporação, entre outros pontos.
O governo aceitou elevar gratificações e abrir nova discussão sobre código de ética e plano de carreira. Também disse que vai rever processos contra PMs da greve de 2012.
"Pensamos muito mais na sociedade, que paga nossos salários", afirmou o soldado Prisco, após cerca de mil policiais aprovarem o fim da greve em assembleia.
A greve deste ano foi marcada pela rapidez na ação do governo federal, que diz ter enviado cerca de 6.000 homens do Exército e da Força Nacional ao Estado.
Os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o interino da Defesa, Juniti Saito, foram ontem a Salvador para planejar a ação das tropas, que deverão ficar no Estado até a situação se normalizar.
Wagner cobrou do STF (Supremo Tribunal Federal) uma "posição mais clara" sobre o direito de greve às Forças Armadas. "Existe sempre risco de prevalecer a desordem."
Antes do fim da greve, duas decisões judiciais determinavam o encerramento da paralisação, sob pena de multa caso de descumprimento.
Embora a Constituição proíba a sindicalização e a greve de militares, paralisações de PMs já ocorreram no Rio, Bahia e Ceará desde 2012.
No campo político, o prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM), que fez campanha ao lado de Prisco e é rival de Wagner, disse ter "torcido" pelo fim da greve.
Procurado para comentar a paralisação, o senador Aécio Neves (MG), presidente nacional do PSDB e pré-candidato à Presidência, não respondeu ontem.

'Nunca me senti tão insegura', afirma turista de SP
DO ENVIADO A SALVADOR
A greve da PM baiana mudou os planos do feriado prolongado de Páscoa da modelo Natany Souza, 22.
Moradora de Santos, no litoral de São Paulo, ela desembarcou em Salvador anteontem, para duas semanas de descanso.
Logo que chegou, Natany soube que a casa de sua anfitriã havia sido furtada horas antes por bandidos.
"Se soubesse que o clima estava assim, jamais teria vindo. Nunca me senti tão insegura na vida."
A casa da amiga, no bairro da Boca do Rio, na orla da cidade, foi invadida na primeira noite da greve --ladrões entraram pela janela e levaram uma TV de 42 polegadas.
"Passei noites em claro temendo que voltassem", disse a modelo, que resolveu encurtar a sua estada. Amanhã ela irá de carro para Aracaju (SE).
"Nunca mais quero vir para cá", afirmou a modelo.
Pelas ruas de Salvador, a impressão ontem era de queda no movimento nos principais pontos turísticos.
Mesmo após o anúncio do fim da greve, no começo da tarde, atrações continuaram vazias ao longo do dia.
No Pelourinho, por exemplo, lojas de artesanato fecharam as portas --algumas instalaram tapumes nas fachadas para evitar saques.
A reportagem da Folha encontrou dois policiais militares fazendo ronda no local. Ao serem abordados, o conselho dado por eles foi para que a equipe deixasse o local devido ao risco de assalto.
Nas praias do Farol e do Porto da Barra, o movimento ficou abaixo do esperado para o feriado. Praias estavam desertas, e ambulantes reclamaram das vendas tímidas.
A circulação de ônibus também continuava restrita à tarde, e a Força Nacional de Segurança era vista em maior número nos pontos turísticos.

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