domingo, 1 de setembro de 2013

Abordagem policial não pode violar direitos do suspeito


ATITUDE JUSTIFICADA

retenção do brasileiro David Miranda por nove horas no aeroporto de Heatrow, em Londres, no último dia 18 de agosto, gerou questionamentos e críticas quanto à ação da Polícia local. David é companheiro do jornalista Glenn Greenwald, autor de reportagens sobre programas de ciberespionagem promovidos pela Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA). A retenção para interrogatório teve como base a lei antiterror de 2000, e levou o Itamaraty a classificar o ato como “medida injustificável”.

Alberto Toron - 08/08/2012 [Nelson Jr./SCO/STF]No Brasil, porém, não é raro ver blitzes policiais que enquadram suspeitos com requintes de "mãos na cabeça" ou "deite-se no chão", mesmo sem ameaça aparente. O criminalista Alberto Zacharias Toron (foto), no entanto, explica que é proibida no Brasil a prisão para averiguação, ação comum durante a ditadura militar. Segundo ele, a prisão só pode se dar em flagrante delito, de forma temporária, preventiva ou por sentença. Apesar de proibida — é válida apenas durante o Estado de Exceção — e remeter ao período ditatorial, a prática ainda ocorre, de forma isolada, em algumas situações, aponta o advogado Guilherme San Juan Araújo.

O cidadão, afirma Toron, pode permanecer em silêncio, tem garantida a sua integridade física e pode telefonar para a família e avisar um advogado. Não é necessário que o policial leia esses direitos. No entanto, os policiais também não podem colocar qualquer suspeito no chão ou com as mãos para trás durante a abordagem, uma vez que isso configura abuso de autoridade.

No entanto, conclui Toron, a autoridade policial pode fazer a tradicional revista. Guilherme San Juan Araújo destaca que, a rigor, todo cidadão deve saber o motivo pelo qual está sendo averiguado ou investigado, sendo que a busca e a apreensão não podem ter como base apenas a postura da pessoa.

Roberto Podval - Lançamento do Código Penal Comentado - Delmanto [Jeferson Heroico]O criminalista Roberto Podval(foto) diz que abusos são uma exceção na atuação policial, mas, quando ocorrem, devem ser punidos pelas autoridades. Essas situações, segundo ele, poderiam ser evitadas se passasse a ser exigida formação jurídica dos policiais militares. Segundo Podval, hoje não é necessário qualquer conhecimento jurídico para que um cidadão tente se tornar um policial militar. O ideal, em sua opinião, seria, com a valorização salarial, melhorar o nível da admissão de futuros policiais, o que poderia reduzir os abusos.

Guilherme Araújo resume a diferença entre a conduta dos cidadãos e a dos agentes públicos: os primeiros não podem cometer qualquer ato vedado pela lei, enquanto os policiais têm a conduta regida pela estrita legalidade, ou seja, podem fazer apenas o que a lei prevê.

Recíproca na Copa
Estrangeiros que venham ao Brasil não viverão situação semelhante à enfrentada por David Miranda, uma vez que o Brasil não possui lei de terrorismo. Isso pode mudar até a Copa do Mundo, no que depender da Comissão Mista de Consolidação das Leis. Instalada em abril pelo Congresso, a comissão trabalha na tipificação do crime, com base no texto do deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), que já foi alvo de sugestões de diversos parlamentares.

Gabriel Mandel é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 31 de agosto de 2013


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