segunda-feira, 25 de abril de 2011

"O SERVIÇO POLICIAL MILITAR E O EXCESSO DE HORAS TRABALHADAS"

A Constituição de 1988, ao estabelecer a carga horária máxima de trabalho quis com que o empregador ficasse adstrito às 44 (quarenta e quatro) horas semanais, sob pena de ter que pagar horas extras a seus funcionários. No caso dos policiais militares dos Estados, verificamos a existência de normas diferenciadas. No Estado de Goiás a lei determina a jornada mínima de 40 (quarenta) horas semanais, em contrapartida, não há norma que estipule a carga horária máxima.

 
Neste diapasão, justificam a exigência do mínimo em lei porque assim como no Exército os militares podem agir a mando de seus Comandantes e Governantes a qualquer momento em qualquer hora do dia, desde que, haja uma crise que exija a utilização não rotineira de um efetivo maior para garantir a ordem, salvar vidas e manter a lei, sem qualquer ônus referente ao excesso de horas trabalhadas para o Estado. Só há um problema com a norma é que esta excepcionalidade virou regra para as policias dos Estados.
Em Goiás estamos vivendo um Estado de ordem social aceitável e, não se faz necessário a ultrapassagem do mínimo de 40 (quarenta) horas, exceto pela necessidade de contratação de mais homens, o que não significa emergência ou crise, mas, falta de planejamento Estatal.
 
Os militares dos Estados suportam cargas excessivas de trabalho e a falta de efetivo pressiona os Comandos a estabelecerem jornadas que vão além das 44 (quarenta e quatro) horas semanais, tudo isso, sem a devida remuneração pelo trabalho extra realizado. Chegamos ao ponto de editarmos leis que regulamentaram o serviço voluntário por tempo determinado a fim de resolvermos o problema de efetivo no âmbito da Corporação Militar de Goiás[1], contrariando normas constitucionais que exigem a necessidade de excepcional interesse público[2].
 
Com o fim dos famosos "boinas azuis" instituídos pela lei 14.012/01, promulgamos em seguida a lei 15.125 de 25 de fevereiro de 2005 que regula o serviço voluntário fora da jornada normal de trabalho, mediante retribuição pecuniária específica, ou seja, um "salário virtual" que não irá englobar o que hoje denominamos de subsídio, tudo isso para que o Estado não suporte uma contratação em massa de policiais militares.
Entretanto, quem paga os prejuízos deste excesso de carga horária não é só o militar, mas, toda sociedade que não terá uma prestação de serviço à altura de suas exigências, pois, teremos nas ruas policiais cansados e "estressados" em suas atividades. Queremos uma polícia de 1º (primeiro) mundo, mas não tratamos nossos policiais com a mesma dignidade destes países.
 
A PMGO (polícia militar de Goiás), pode optar por uma carga horária mínima de 40 (quarenta) horas semanais, entretanto, isto exige um estado de ordem social, que historicamente nunca existiu, logo, se estamos há décadas em estado de exceção ou crise que justifique a extrapolação deste mínimo trabalhado a patamares além dos estabelecidos constitucionalmente pelo trabalhador comum, porque então adotarmos o mínimo se o máximo virou regra e não exceção?
 
Tamanha injustiça se perdura há décadas, portanto, nada mais justo do que a fixação exata da jornada máxima de trabalho para o militar nos períodos de ordem social, pois, aquilo que ultrapassá-la será levado em consideração para o pagamento das horas-extras ou de uma possível compensação de horas.
Sabemos que o regime militar, obriga ao exercício de escalas extraordinárias, mas, isso deve ser plenamente justificado, através dos estados de exceções, os quais são decretados pelos nossos chefes de governo, isso não tira o direito de qualquer Comandante convocar extraordinariamente o militar para determinada missão, desde que, nessa convocação exista motivação e nela haja necessidade e urgência, pois, do contrário teremos necessariamente de pagar pelo trabalho extra.
 
O que verdadeiramente falta em todos os Estados, é um rígido controle das horas trabalhadas dos militares. Sem a devida limitação ao direito discricionário dos chefes de governos e comandantes militares de exigirem em tempo de ordem social o exercício de uma jornada não superior as 44 (quarenta e quatro) horas semanais permitidas pela Constituição, não será atingida a dignidade humana destes trabalhadores.
Tudo isso é fácil quando sabemos que basta especificarmos em lei que as horas extraordinárias motivadas por crises, não geram direito as horas-extras. A partir de então será garantido a todos um tratamento digno, pois, sabemos que não estamos sempre em momentos de crise! O controle mais rígido das Escalas de Serviço, e adoção de equipamentos de registros de entrada e saída, assim como nas empresas particulares garante maior efetividade e controle da jornada excedente. Todos querem o uso destas tecnologias para se fazer justiça, exceto àqueles que sabem retirar do caos e da desordem o proveito próprio.

Vejamos uma breve síntese da jornada de trabalhador comum e do militar :
Trabalhador Regido pela CLTJornada Horas semanais Horas mensais
Y08 (oito) horas diárias
44 horas
176 horas
MILITAR
Jornada de trabalho
Horas semanais
Horas mensais
MILITAR
12X36
48 horas inclusive domingo (diurno)
180 horas
MILITAR
12x24
36 horas engloba trabalho noturno
240 horas mensais. Considerando 20% ( com 20 (vinte) serviço no mês)
MILITAR
24X48
Variação de dois a três serviços na semana inclusive feriados
240 hs mensais com 10 serviços no mês
MILITAR
Expediente
36 horas
144 hs mensais


Na PM há vários tipos de escalas entre elas : 12x36; 24x48 , 12x24 e 24x72, inserimos o Quadro acima tão somente para fixar um parâmetro comparativo entre o trabalhador militar e o trabalhador regido pela CLT ( Consolidação das Leis Trabalhistas) que trabalha 176 (cento e setenta e seis) horas mensais e que quando laboram acima deste patamar recebem de seu empregador horas-extras.
 
Desta feita, constatamos que quando o militar do Estado de Goiás, não trabalha as 40 (quarenta) horas mínimas este é obrigado a completá-la através do famigerado Banco de Horas[3], entretanto, a mesma justiça não é vista em favor daqueles que trabalham em regime de escalas. Na jornada 12x36 nossos militares trabalham cerca de 180 (cento e oitenta) horas mensais, ou seja, 4 (quatro) horas a mais que um trabalhador comum trabalha isso sem contar que estas escalas não contam a hora noturna como sendo de 52 (cinqüenta minutos e 30 segundos), ou seja, o período de 12 (doze) horas trabalhadas no período noturno equivaleria a aproximadamente 2 (duas horas) a mais por dia de serviço, em resumo nosso militar está trabalhando aproximadamente 20 (vinte) horas ao mês e a mais do que aqueles que exercem escalas diurnas, acaso considerássemos que a hora noturna equivalesse a 52(cinqüenta e dois) minutos e trinta segundos. Tendo em vista que eles irão receber o mesmo salário no final do mês, isto é extremamente injusto.
 
Nas escalas 24x48 e 12x24, o trabalhador militar labora cerca de 240 horas mensais; na terceira escala 24x72 o militar trabalha cerca de 192 (cento e noventa e duas horas) no mês. Portanto, concluímos para a felicidade do Estado, que o regime adotado de escala está em descompasso com o que prevê nossa Carta Maior, pois, este limite fere a dignidade humana insculpida como direito fundamental.
 
A carga horária máxima trabalhada, não foi estipulada por acaso no texto constitucional, sendo sua extrapolação um direito excepcional que não deve ser exercido por ninguém sem que haja limites legais para o seu exercício, o que engloba todos os trabalhadores inclusive o militar, mesmo sendo regido por leis especificas que não engloba o direito de jornada máxima.
 
Ademais no quadro analítico já proposto não consideramos o número de feriados nacionais no Brasil e mesmo os feriados regionais, para assim auferirmos uma comparação real entre o trabalhador que exerce atividade de expediente e o Trabalhador Militar que exerce regime de escalas ininterruptas de serviço. Portanto, a idéia de que o miliciano trabalha pouco é mera especulação.
 
Em 1975, nossa PMGO optou em lei por uma carga horária de 40 (quarenta) horas semanais, porque então estes milicianos trabalham mais do que isso nos regimes de escalas? A história explica o quanto o Brasil viveu por períodos ditatoriais onde os militares viveram constantemente aquartelados e em regime de prontidão constante a mando de seus comandantes e chefes políticos, isso levou a instituição a adotarem escalas desumanas próprias do Estado de Guerra e que hoje ainda são utilizadas.
 
O que cabe ao Administrador em tempo de ordem social e política é tão somente cumprir o mínimo, pois, o máximo não está previsto, justamente para garantir o uso desta força auxiliar nos momentos de crise, fato este excepcional que infelizmente é tratado como regra. Vejamos o que diz a lei 8.033/75:
 
Art. 30 - Os deveres Policiais-Militares emanam de vínculos racionais e morais que ligam o Policial-Militar à comunidade estadual e à sua segurança, e compreendem, essencialmente:
 
I - a dedicação integral ao serviço Policial-Militar e a fidelidade à instituição a que pertence, mesmo com o sacrifício da própria vida;
 
Parágrafo Único - A dedicação integral a que ser refere o item I deste artigo sujeita o Policial-Militar à jornada mínima de 40 (quarenta) horas semanais de trabalho". Acrescido pela Lei nº 10.623, de 24-8-88, DO. de 1-9-88.
 
Com o advento da Constituição todos os empregadores ficam limitados a exigirem de seus funcionários que trabalhem no máximo 44 (quarenta e quatro) horas semanais, sob pena de pagarem horas extras; o mesmo texto não impede que o empregador estabeleça uma jornada menor. A Constituição fala em trabalhadores, acaso o militar não é um trabalhador? Vejamos:
 
Art 7 - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem a melhoria de sua condição social:
(...)
XIII – duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.
Vejamos agora o rol que a nosso ver deve abranger o Direito a Jornada Mínima, mas, que a Doutrina entende ser um rol taxativo.
 
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
 
§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições:(Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)
(...)
VIII - aplica-se aos militares o disposto no art. 7º, incisos VIII, XII, XVII, XVIII, XIX e XXV e no art. 37, incisos XI, XIII, XIV e XV;(Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)
(...)
X - a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)
A lei 8033/75 do Estado de Goiás é omissa quanto ao aspecto da jornada máxima de trabalho que um policial militar pode exercer, entretanto, não há proibição Constitucional, para a fixação deste limite, basta fazermos uma leitura do Art. 42 da Constituição. Vejamos:
 
Art. 42 Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)
 
§ 1º Aplicam-se aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, além do que vier a ser fixado em lei, as disposições do art. 14, § 8º; do art. 40, § 9º; e do art. 142, §§ 2º e 3º, cabendo a lei estadual específica dispor sobre as matérias do art. 142, § 3º, inciso X, sendo as patentes dos oficiais conferidas pelos respectivos governadores.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98)
Portanto, é imprescindível que corrijamos esta falha legislativa para proporcionar não só ao militar a segurança jurídica necessária para que não haja distorções teratológicas que ferem a Dignidade do Trabalhador Militar e a própria Constituição Federal.
 
Não é errada a atuação do Comando em exigir do militar que ele exerça a jornada mínima de 40 (quarenta) horas semanais, entretanto, fugimos da discussão em querer estabelecer o máximo de nossa jornada, pois, sabe-se que existe em nosso meio escalas que atropelam o princípio da dignidade humana.
Todo esse excesso de trabalho somado com as escalas extraordinárias que todo militar é obrigado a participar o impedem do convívio com a família, do lazer, da cultura, direitos estes consagrados pela nossa Constituição. É preciso colocar ordem e estabelecer a justiça a este trabalhador incansável!
A profissão por si só é extremamente perigosa e considerada uma das profissões mais "stressantes" da atualidade. A atividade de segurança implica, não raras vezes, submeter-se a audiências na justiça, a flagrantes que ultrapassam as escalas normais de serviço e ainda a outras atividades de caráter urgente, que exigem a presença do policial.
 
De fato propomos uma mudança na lei 8.033/75, retirando do Estado a exigência do mínimo e interpondo como máximo às 40 (quarenta) horas semanais, isto evita escalas injustificadas e garante um mínimo de segurança jurídica evitando o excesso do poder discricionário das diversas autoridades que muitas vezes procuram apenas satisfazer os anseios políticos dos governos.
Enquanto o problema não é resolvido, aguardamos o Ministério Público do Trabalho que volva seus olhos não só para os trabalhadores regidos pelo regime da CLT, até porque não está escrito na Constituição que militar não é trabalhador!
 
FONTE: BLOG DA RENATA e Blog Direito  dos Policiais  Militares

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