Nº do Processo 12156.2320.108170-/0
Recurso Procedimento ordinário
Comarca Recife
Vara Vigésima Terceira Vara Cível da Capital
Relator Karina Pinheiro D'Almeida Lins
Partes
Advogado MARTA MARIA BARRETO VIEIRA GUIMARãES
Autor J. T. F.
Réu BANCO BMG S/A
Movimentação Excluída
Data 12/05/2010 17:37:00
Fase Devolução de Conclusão - ASSESSOR
Movimentação
Texto PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE PERNAMBUCO JUÍZO DE DIREITO DA 23VARA CÍVEL POR DISTRIBUIÇÃO DA CAPITAL - RECIFE - PE Processo nº 0012156-23.2010.8.17.0001 DECISÃO INTERLOCUTÓRIA Trata-se de ação ordinária com pedido de antecipação de tutela, por meio da qual pretende o autor J. T. F. compelir o demandado BANCO BMG S/A a suspender os descontos em folha de pagamento. No caso vertente, afirma o autor, policial da reserva, que por meio do convênio celebrado entre o Estado de Pernambuco e o Banco BMG S/A, formam enviados cartões de crédito aos militares. No entanto, sem sua autorização, os valores das faturas passaram a ser descontados em folha de pagamento, incidindo, inclusive, juros exorbitantes. Ressalta, ademais, que já adimpliu com o devido e pagou parcelas a mais. Aduz o autor, que está recebendo, mensalmente, o valor de R$ 401,32 (quatrocentos e um reais e trinta e dois centavos), porquanto o desconto em folha é de R$ 1.715.67 (mil setecentos e quinze reais e sessenta e sete centavos). Em face da notória ilegalidade do desconto, dada a impenhorabilidade do salário, requer a antecipação de tutela para suspender futuros descontos em folha de pagamento. Solicita, ao final, o cancelamento definitivo de desconto em folha de pagamento, bem como repetição de indébito e indenização por danos morais por lesão ao consumidor. Vieram-me os autos conclusos para decisão. DECIDO. O convênio assinado entre o Estado de Pernambuco e a empresa BNL ? BNL CONSULTORIA E SERVIÇOS LTDA, tem gerado várias demandas judiciais, nos últimos tempos. Isso porque o objeto da negociação foi o fornecimento de cartões de crédito e débito, no bojo dos cartões de saúde, necessários para a utilização do serviço médico oferecido pela Corporação, inclusive à aqueles prestados pelo Hospital da Polícia Militar. As faturas mensais passaram a ser descontadas em folha de pagamento, o que acabou por comprometer, significativamente, o salário do servidor. Portanto, o cerne da questão é saber se, no presente caso, é lícito o desconto, em folha de pagamento. Quanto a presente controvérsia, o STJ vem diferenciando duas hipóteses de empréstimo e, a cada uma, vem dando tratamento específico. Nos contratos de mútuo celebrados com cláusula de desconto em folha de pagamento, o tomador do empréstimo se beneficia de condições vantajosas, como juros reduzidos e prazos mais longos, ao passo em que a satisfação do crédito encontra limites claros, em conformidade com a legislação específica. Nesse caso, é válida a cláusula que autoriza o desconto, na folha de pagamento do empregado ou servidor, da prestação do empréstimo contratado, a qual não pode ser suprimida por vontade unilateral do devedor, eis que da essência da avença celebrada em condições de juros e prazo vantajosos para o mutuário. Para as outras formas de empréstimo, onde não se vê a comutação clara entre garantias e condições mais vantajosas de pagamento, o STJ entende que, em nosso ordenamento jurídico, nem mesmo ao Poder Judiciário é lícito penhorar salários, no processo de execução (CPC, Art. 649, IV). A autorização contratual para que o credor se aproprie do salário pago ao devedor constitui evidente fraude ao Art. 649, IV, do CPC. Cabe ao banco obter o pagamento da dívida pelos meios ordinários. Nesse sentido, confira-se: RECURSO ESPECIAL. CONTA-CORRENTE. SALDO DEVEDOR. SALÁRIO. RETENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. - Não é lícito ao banco valer-se do salário do correntista, que lhe é confiado em depósito, pelo empregador, para cobrir saldo devedor de conta-corrente. Cabe-lhe obter o pagamento da dívida em ação judicial. - Se nem mesmo ao Judiciário é lícito penhorar salários, não será instituição privada autorizada a fazê-lo. (REsp 831.774/RS, 3a Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 29/10/2007). O caso dos autos está inserido na segunda hipótese acima narrada, pois o desconto automático do salário ocorre junto à conta corrente que mantém perante a instituição financeira credora. Dessa maneira, não se pode legitimar a conduta da instituição financeira que, para ter seu crédito, compromete a sobrevivência do autor, com a expropriação do seu salário. Tal conduta viola o art. 1º, inciso III e art. 7º, inciso X da Constituição Federal, o art. 51 do CDC, bem como o art. 649, IV do CPC. Presentes, portanto, os requisitos autorizadores para a concessão da antecipação de tutela perseguida, já que o fundado receio de dano irreparável está a toda evidência com o autor que não pode ter um vida digna com a percepção de apenas R$ 400,00 (quatrocentos reais) por mês, ou seja, menos que 1 salário mínimo. A prova inequívoca está consubstanciada nas provas documentais, como os contracheques de fls. 09/17, as faturas do cartão de fls. 18/22 e 26/29, bem com o contrato de fls. 30/34 dos autos. Verifico, ainda, que o contrato não foi assinado pela parte autora, pois, nos termos das fls. 30/34, a aceitação do crédito caracteriza a adesão ao contrato de empréstimo pessoal/financiamento. Ademais, conforme se verifica no comprovante de operação, as cláusulas gerais estão registradas no Cartório de Registro de Títulos e documentos de Belo Horizonte, o que dificulta o acesso por parte do autor. Tal forma de contratação de concessão de crédito, com remessa a outro instrumento contratual, ainda que devidamente registrada em cartório, sem que o consumidor tenha ciência dos encargos assumidos, é nula de pleno direito, posto que vedado pelo art. 52, II do CDC. DIANTE DO EXPOSTO, e com fundamento nos artigos 273, I, do CPC, CONCEDO A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA PLEITEADA, para determinar que a instituição financeira demandada se abstenha de realizar descontos no salário do autor JOEL TARGINO FERNANDES, oriundos dos contratos de nº 186706930, 189439547, 190300511 e 188047303, objeto da presente lide, a partir da folha de pagamento de maio. Estipulo multa no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), por cada dia de atraso no efetivo cumprimento do determinado, sem prejuízo da responsabilização penal, por crime de desobediência. Oficie-se, ainda, a Diretoria de Recursos Humanos da Polícia Militar de Pernambuco, dando ciência desta decisão. Feita a necessária intimação, no mesmo mandado, cite-se a empresa ré para, querendo, oferecer resposta no prazo legal de 15 (quinze) dias, sob pena de confissão e revelia, conforme preceituam os artigos 285 e 319, do CPC. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se. Recife, 10 de maio de 2010. Karina Pinheiro D'Almeida Lins Juíza de Direito 1
Postado por Adeilton9599
Fonte: TJPE
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