Do UOL, em São Paulo
Não era só pela redução de R$ 0,20 na passagem de ônibus que pelo menos 100 mil pessoas saíram às ruas em São Paulo no dia 17 de junho deste ano. Depois de assistir a uma forte repressão da polícia contra manifestantes pacíficos no dia 13 de junho, havia quem passou a pedir, além da queda no valor da tarifa, mudanças no aparelho de segurança pública do Estado.
No ano em que policiais militares foram condenados pelo massacre do Carandiru, decisão considerada como "marco civilizatório", a discussão sobre a violência policial deixou de ser marginal. Quando ela tomou as manifestações, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), resolveu que era hora de apontar culpados."Não ficou bem", disse o petista sobre a forma como a PM paulista tratou manifestantes naquele dia 13.
Ato contínuo, o governador do Estado, Geraldo Alckmin (PSDB), a quem a PM é subordinada, determinou a apuração dos atos violentos e vetou o uso de balas de borracha e de bombas de gás. Não adiantou --a partir dali, os manifestantes é que foram os protagonistas das cenas de violência. Haddad, então, mudou de ideia.
"O que houve ontem [dia 18 de junho] no centro [de São Paulo] foi uma atrocidade", disse, ao se referir a vândalos que depredaram o prédio da prefeitura e diversas lojas na região central de São Paulo.
Acuados, Alckmin e Haddad, anunciaram, no dia 19 de junho, a redução do valor da passagem. Aproveitaram também para deixar para depois a discussão sobre a eficiência dos órgãos que cuidam da segurança da população.
No Rio, não foi diferente. Uma foto de um PM atacando com gás de pimenta uma manifestante foi parar na capa do "New York Times", que fez críticas à atuação da polícia nos atos. Outros veículos de comunicação seguiram na mesma linha. A própria polícia, depois, achou que havia exagerado.
O governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), reclamou, mas tinha um problema ainda maior a resolver: o desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza depois de ter sido visto sendo interrogado por policiais militares da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da Rocinha. Depois pressão, veio a descoberta que Amarildo foi torturado e morto por policiais.
Para especialistas, as manifestações cobravam, de maneira indireta, uma maior eficiência das nossas corporações. E isso só poderá ocorrer quando os governos passarem a tratar a segurança pública como prioridade.
Falta de preparo
Uma semana depois de os protestos eclodirem pelo país, especialistas já criticavam a forma como o Estado tratou as manifestações. "A ampla maioria dos manifestantes e da população é contra as depredações, mas a ação policial dos primeiros dias acabou rompendo os laços de confiança com a sociedade. É preciso recuperá-los", afirmou o especialista em segurança pública Marcos Rolim.
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"A polícia não estava preparada para os protestos", disse José Vicente da Silva, ex-secretário nacional de Segurança Pública, cargo que ocupou entre julho e dezembro de 2002, no segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
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"Apesar de São Paulo ter uma estrutura forte de treinamento, as manifestações não tinham liderança e eram espontâneas, dois fatores novos, nunca vistos", afirmou. "O sistema não respondia ao problema", afirmou Silva.
Violência, desmilitarização e unificação das polícias
A exposição da violência durante os protestos expôs uma realidade que há tempos assusta a população comum.Dados da Ouvidoria das Polícias do Estado de São Paulo apontam que as denúncias de excessos cometidos por policiais militares durante abordagens cresceram 106% no primeiro semestre de 2013 em comparação com o mesmo período do ano passado. Foram 66 reclamações registradas neste ano ante 32 em 2012 --os números do segundo semestre não foram fechados.
Com relação à Polícia Civil, o problema é outro. Foram 141 queixas de mau atendimento no primeiro semestre de 2012, ante 213 este ano, um aumento de 51%. As infrações disciplinares reportadas à Ouvidoria aumentaram 47%, de 60 no ano passado para 88 em 2013.
Há ainda quem exija a desmilitarização da polícia. "Isso é bandeira de um grupinho de intelectuais que não encontra eco na população em geral", afirmou Silva.
"Contingentes numerosos sentem-se autorizados a perpetrar essas brutalidades, autorizados não necessariamente pelos seus superiores, pelos seus chefes, mas pela sociedade, que aplaude e se omite diante desses fatos", afirmou Soares durante audiência da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo --que apura crimes cometidos pela ditadura militar brasileira (1964-1985). Soares afirmou ainda que os governos, às vezes por omissão, acabam tolerando e tornando-se cúmplices da violência.
José Vicente da Silva afirmou que é necessário que o país comece a pensar na unificação das polícias. Segundo ele, apesar de a PM sofrer com um "ranço persistente" por conta da ditadura, a Polícia Civil (ou Judiciária) também é opressiva. "O modelo de repressão do inquérito não dá chance de defesa", disse.
Agenda permanente
Para a coordenadora de Justiça e Segurança Pública do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, o que falta aos seguidos governos --federais, estaduais e municipais-- é tratar o assunto como prioridade. "Precisamos de uma agenda permanente", disse. Carolina afirmou ainda que tal agenda precisa também proteger não só o cidadão, mas o trabalho do policial. "Os governos não assumem sua resposabilidade na segurança pública", falou.
"Nosso modelo não responde mais às necessidades. Ter duas polícias estaduais é muito pouco produtivo", afirmou.
Para ela, que disse não ter a conviccção de que a unificação das atuais corporações seja a melhor saída, om ideal é que a "polícia faça seu trabalho com um ciclo completo e não fragmentado, como ocorre hoje".
Por fim, disse ela, é necessário também cobrar eficiência. "É preciso estabelecer metas e cobrar resultados", disse.
A polícia com a ajuda do governo fez o seu papel e foi atrás do caso Amarildo, isso ninguém pode negar. A polícia inteira do Rio estava empenhada!
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