Uma adulteração em um dos gabaritos da prova para o curso de formação de cabos do Corpo de Bombeiros para favorecer um soldado deixou o exame sob suspeita, como mostrou a reportagem de Naim Campos no Estúdio SC de domingo (4). A alteração foi descoberta no momento da correção por uma comissão formada por seis militares. O coronel José Mauro da Costa, nomeado diretor de ensino, assumiu a autoria. Em depoimento reservado, ele admitiu ter substituído o gabarito da prova e pode ser expulso da corporação (veja vídeo).
O edital de convocação para o curso de formação de cabos, que não ocorria há mais de duas décadas, foi lançado em janeiro deste ano. Foram oferecidas 150 vagas: 120 pelo exame de seleção e outras 30 para os soldados mais antigos. A prova teórica foi realizada no dia 28 de fevereiro nas cidades de Florianópolis, Blumenau, Curitibanos, Criciúma e Chapecó. Cerca de 500 soldados se submeteram ao exame.
Seis dias depois, todas as provas foram corrigidas no prédio do Comando-Geral, em Florianópolis, por uma comissão formada por seis militares. A alteração em um dos gabaritos mostrava que o exame havia sido fraudado. O coronel José Mauro da Costa foi comunicado da falha. De acordo com o inquérito da Polícia Militar, a reação do coronel foi orientar para que o fato fosse formalizado por meio de uma comunicação interno, encaminhada no dia 6 de março. Nela, a fraude foi comprovada.
No depoimento, o tenente coronel que descobriu a irregularidade revelou que ao colocar a matriz de correção sobre o gabarito de um soldado da capital, "percebeu que ela não se alinhava de forma padrão", o que levantou a suspeita. A suspeita se confirmou na comparação entre as respostas que o soldado havia assinalado ao lado das questões na prova e as respostas colocadas no gabarito adulterado. Haviam sido modificadas 21 questões para que o candidato acertasse 49 das 50 questões da prova, deixando apenas uma em branco.
"Eu o conheço de longa data. Ele fez isso no sentido de ajudar, só que fez uma 'meleca'. E o que aconteceu, na verdade? A gente afastou da função, fez esse processo e quer corrigir para que isso não se repita sob nenhuma hipótese. A gente tem que ter lisura no processo desde o início", disse o comandante do Corpo de Bombeiros, Marcos de Oliveira.
Após a comprovação da fraude, o coronel Mauro assumiu a autoria do caso. Quando questionado sobre o motivo, ele disse que sentiu a obrigação de sanar uma injustiça feita a um soldado por ele não ter recebido uma promoção depois de um "ato de bravura". Ainda segundo o coronel, isso havia provocado desânimo e insatisfação no soldado.
Inquérito Policial Militar 
O comandando-geral da corporação só instaurou Inquérito Policial Militar dia 8 de abril, um mês e dois dias após a descoberta da fraude. O curso não foi suspenso e seguiu o andamento normal com os soldados que tiveram melhor desempenho na prova sendo chamados para compor as turmas de futuros cabos. A continuidade foi garantida porque, segundo o comandante do Corpo de Bombeiros, não havia possibilidade de outras irregularidades.
"Todas as provas vieram com os lacres intactos. As 516 provas estavam na mesa. O que aconteceu é que foi ali que ele abriu o lacre, pegou a prova original e simplesmente deve ter tirado debaixo da mesma, sei lá, ou ele tinha a prova, e trocou uma por outra", suspeita o comandante do Corpo de Bombeiros.
Esta não é a mesma opinião dos soldados que participaram da prova. "Isso tira toda a credibilidade da seleção. Como a gente pode ter certeza que um concurso desse está sendo feito de maneira correta?", disse um dos soldados, que preferiu não se identificar.
Uma carta escrita a próprio punho pelo coronel Mauro ao comandante-geral mostra a intenção de que o caso não fosse parar na Justiça Militar. Para isso, o coronel tenta convencer o comandante sobre qual rumo deveria seguir a punição pelo crime cometido por ele. Diz o texto: Opinando pela instauração de procedimento administrativo disciplinar, pois conforme informado pessoalmente já houve manifestação do culpado pela fraude.
Na mesma carta, o coronel ainda isenta o soldado que seria beneficiado pela troca de gabarito, assumindo toda a responsabilidade pela adulteração.
Dois meses após a fraude ter sido descoberta, o inquérito chegou ao Ministério Público. Segundo o promotor Sidney Dalabrida, que ficou responsável pelo caso, tratam-se de "provas contundentes, robustas, de que, efetivamente, um diretor de ensino do Corpo de Bombeiros no exercício de sua função, valendo-se das facilidades da sua prerrogativa, resolveu fraudar um concurso público para auxiliar uma pessoa que era sua conhecida".
A denúncia do promotor será feita à Justiça Militar nesta semana. Para ele, o ato do coronel Mauro provocar a expulsão dele do Corpo de Bombeiros. "Os autos demonstram que ele praticou um crime de falsidade documental, um crime de prevaricação e, além disso, ele praticou um ato de improbidade administrativa", afirmou Sidney Dalabrida.
O promotor destaca que o fato do coronel ter confessado a autoria da fraude não muda nada no processo porque a confissão, segundo mostram os documentos, teria sido na intenção de que o caso fosse resolvido com um procedimento administrativo disciplinar e não chegasse à Justiça Militar, onde o coronel José Mauro da Costa já teve outros três processos, sendo condenado em dois deles.
Por e-mail, o coronel respondeu que está em viagem ao exterior. Ele disse que não houve fraude no curso, e sim uma "tentativa de alteração" no gabarito de uma única prova que foi identificada antes que produzisse "qualquer efeito". O nome do candidato não foi divulgado porque o inquérito isenta a responsabilidade del